* Por Vanessa Caldas
Olá pessoal do Startupi! Eu e meu marido, Ariel Alexandre, também empreendedor, fomos selecionados pela Samsung e ANPROTEC para uma missão empreendedora na Coreia do Sul. Foram duas semanas conversando com investidores, mentores, aceleradoras e com a própria Samsung. Eu me surpreendi muito com o ecossistema de lá e resolvi compartilhar algumas curiosidades com vocês. Vamos lá!
Alguns dados sobre a capital: Seul concentra o maior número de startups e tem aproximadamente 892 startups. O setor de “música & áudio” é o que concentra o maior número de startups, seguido de “pessoas & sociedade”. O volume de investimentos em startups nos últimos 12 meses foi de $357,710,821. Fonte: Funderbeam.com.
Parece brincadeira, mas na prática percebemos que em todos os países que passamos, a referência é sempre o Vale do Silício, na Califórnia. Ei, espera, eu vim para entender o ecossistema e a mente da Coreia do Sul, não do Vale do Silício. Modelo de pitch no Vale, investidores do Vale, empresas do Vale, o Vale... o Vale. Essa parte me decepcionou, e muito.
Entretanto, o modelo deles de Demo Day é algo que me surpreendeu muito. Fomos a um Demo Day que contou com a participação da presidente Park Geun-hye, uma das maiores incentivadoras do empreendedorismo e a cabeça por trás do crescimento do número de startups na Coreia do Sul. É um show, com mistura de K-pop, pitch com direito a apresentação com personagens, uma marca muito forte dos coreanos.
Pitch em Seul — Coreia do Sul
Em maio deste ano, aconteceu o primeiro meetup do Techcrunch em Seul e o Google inaugurou o seu primeiro Campus coreano. Só em 2014, KVIC relatou que US$1,4 bilhão foi investido em startups coreanas, o maior investimento foi no Coupang, o maior e-commerce da Coreia do Sul que recebeu US$300 milhões e na BaeDal Minjok, um serviço de entrega de comida com US$36 milhões. Em janeiro de 2015, 30.052 novas empresas de risco foram abertas e registradas em todo o país, contra apenas 15.409 em 2009.
Os coreanos valorizam (e muito) tudo que é feito por eles, eu chamaria de protecionismo do bem
Google. Naver. Snapchat. Snow - O Google Maps não funciona muito bem por aqui. O buscador mais utilizado é o Naver (criado em 2006 por ex-funcionários da Samsung). Em setembro de 2015 o Naver lançou o Snow, uma cópia quase que exata do amarelinho Snapchat e já possui mais de 30 milhões de usuários desde então. Soubemos que a Coreia do Sul é expert em copiar, a diferença é que eles copiam muito rápido e muito bem.
Kakao & Line — os gigantes da Coreia do sul
Os dois maiores players digitais da Coreia do Sul são o Naver e a Kakao. Se falarmos em gigantes do mercado podemos considerar Samsung, LG, Hyundai que são players globais.
Kakao em números: Fundada em 2010. 48 milhões de usuários ativos no mundo, incluindo 40 milhões na Coreia do Sul. Movimentou 932.2 bilhões de wons (US$ 808,5 milhões) no ano passado.
Como ganham dinheiro: Em 2012 lançaram o Kakao Game. Muitos jogos adotaram um modelo de negócio em que os usuários precisam convidar amigos do Kakao Talk pagar para jogar mais rodadas ou comprar itens virtuais.
A Kakao atua em várias frentes de negócio, para cada segmento há um produto, além da troca de mensagens o usuário pode pedir táxis, transferir dinheiro, e até mesmo procurar emprego através do aplicativo. Como social network ele disponibiliza uma timeline no estilo Facebook, o Kakao History, onde o usuário pode assistir vídeos e ouvir música. Kakao talk, Kakao Game, Kakao Music, Kakao Farmer e por aí vai. O pulo do gato da empresa foi a Kakao Games, onde eles definitivamente começaram a ganhar dinheiro.
A Coreia do Sul tem aproximadamente 50 milhões de usuários, a Kakao tem 50 milhões de pessoas usando o serviço mensalmente e aproximadamente 10.8 milhões de fora do país.
Em março de 2015 a Kakao lançou a Kakao Taxi, nessa época quem estava por lá era a Easy Taxi mas em um país tão protecionista e com uma capacidade de replicar e abraçar um negócio feito por eles, foi difícil para a Easy Taxi se manter no território coreano e a brasileira acabou encerrando suas operações.
A empresa é referência no país inteiro. O maior player digital da Coreia nasceu em Seul e tem sua sede estabelecida em uma ilha incrível chamada Jeju-Do, chamada pelos coreanos de “ilha do chocolate”. A Kakao foi criada em 2010, ocasião em que a Daum Café (comunidade criada em 1999) ultrapassou 8 milhões de usuários e a empresa passou a se chamar Kakao Corp., mas a companhia Daum existe desde 2004 e foi a primeira a lançar um serviço de e-mail na Coreia do Sul.
[caption id="attachment_87802" align="aligncenter" width="600"] Kakao headquarters - Prédio horizontal (nada por acaso)[/caption]
O campus é dividido em dois espaços: Space 1 e o Space 2 recém-concluído, alocando um total de cerca de 500 funcionários no campus, juntamente com Space.Kids, um espaço creche complementar para os funcionários e Space.House, uma casa de hóspedes para acomodar aqueles que viajam entre Seul e campus de Jeju.
O principal concorrente da Kakao é o Line, adquirido pela gigante Naver.
Naver- o Google da Coreia & Line
O Naver é o Google da Coreia. Um gigante que detém praticamente todo conteúdo coreano e é responsável por mais de 70% do mercado de buscas lá. O Naver foi lançado em 1999 por um grupo de ex-funcionários da Samsung e domina a indústria de pesquisa coreano desde então.
[caption id="attachment_87803" align="aligncenter" width="600"] A Home e a estrutura do Naver lembram muito o Yahoo[/caption]
É muito mais fácil fazer busca no Naver do que no Google. O algoritmo de busca do Naver é construído em torno da língua coreana e com isso ele entrega resultados muito mais relevantes do que o Google, uma vez que a base do idioma do país é bem diferente do Inglês.
O gigante Naver mudou sua sede para Bundang, província de Gyeonggi, em 2010. A sede da Naver, apelidada de Fábrica Verde, possui 27 andares de altura com oito pisos subterrâneos adicionais.
Além de gigante e dominar o mercado de buscas, o Naver está por trás do Line, o principal concorrente da Kakao.
O Line permite que você faça chamadas e troque mensagens gratuitamente, é tão incrível que ultrapassou os limites entre o online e o mundo físico, trazendo os seus famosos stickers utilizados nas trocas de mensagens para a vida real. Os bichinhos mais populares viraram acessórios e brinquedos (com direito a fila na porta quando tem lançamento). Eles possuem várias lojas físicas espalhadas pela Ásia com direito a versão Super size do bichinhos. Eu estou completamente apaixonada!
Line em números: Lançado em 2011. 215 milhões de usuários ativos no mundo todo, destes 68 milhões estão no Japão. Alcançaram US$1,1 bilhões em vendas no ano passado.
Como ganham dinheiro: O Line possui grandes empresas fazendo publicidade, como Toyota e varejista Rakuten. Ele planeja expandir sua base de anunciantes utilizando o modelo de segmentação baseado no conhecimento dos interesses dos usuários. Tais contratos agora custam cerca US$ 500.000 e serão oferecidos a pequenas e médias empresas com taxas mais baixas. O Line apela principalmente para os jovens, muitos dos quais não têm acesso aos cartões de crédito. Para solucionar esse problema foi lançado o seu próprio cartão pré-pago.
[caption id="attachment_87805" align="aligncenter" width="600"] Line - De stickers online para produtos do mundo real[/caption]
O país dos personagens
Eu achava que a Disney era a número 1 em criação de personagens, mas ao me aprofundar no mercado coreano me surpreendi com a maneira que a Kakao e o Line conseguiram ultrapassar a linha do virtual e o real. Os personagens que antes eram apenas emoticons tornaram-se uma febre e conquistaram fãs de outros países.
São lojas e mais lojas com personagens, diversos produtos licenciados, de bloquinhos a bichos de pelúcia passando pelas grandes marcas de maquiagem coreanas.
[caption id="attachment_87806" align="aligncenter" width="600"] Linha de maquiagem da Missha — para o Line[/caption]
A Missha fez uma linha especial para o Line e a VDL uma linha para a Kakao. A cada passo dentro da loja você se depara com uma selfie e muitas caras apaixonadas por tanta fofura. ❤ As filas na porta para tirar foto com ursos gigantes são rotina das lojas. Um fenômeno!
Ouvir música? Eles nem conhecem o Spotify!
Ninguém conhece esse gigante do ocidente por aqui. O mercado de streaming de música conta com vários players menores e praticamente todos eles fazem parceria com as empresas de telecom, oferecendo pacotes de desconto com o objetivo básico de fidelizar o usuário.
Vídeo online - Presença mínima no Youtube.
Considerando os números dos principais canais coreanos podemos perceber que eles não são maioria por lá, o que faz mais sucesso por aqui é o live streaming de pessoas comendo, pessoas cantando e dormindo, vida real ao vivo. Esses mesmos vídeos que foram transmitidos ao vivo são gravados e jogados nos canais do Youtube.
Live - AfreecaTV.
O AfreecaTV ainda me surpreende. As pessoas amam assistir outras pessoas comendo, AO VIVO! Enquanto o usuário assiste ele pode enviar Star ballons (dinheiro) para a pessoa que está fazendo o live. Por quê? por que alguém ficaria em frente ao computador assistindo outra pessoa comendo quilos de comida? Além de ser engraçado, as pessoas comem muita comida no live (muita mesmo) e continuam magras. Tentei entender o porque desse fenômeno e o fato das escolas terem um horário absurdamente exaustivo (de 8h até 23h com pequenos intervalos), é um dos motivos, os adolescente conseguem ter contato com o mundo fora da escola, usando o celular dentro da escola.
[caption id="attachment_87808" align="aligncenter" width="600"] Home do afreecaTV[/caption]
Facebook, Instagram e Twitter
Apesar do Kakao ser o líder de mercado, os coreanos também usam o Facebook para suas publicações diárias, são 16 milhões de usuários ativos na Coreia do sul, mas o Instagram é o mais popular entre os jovens com 6 milhões de usuários. Globalmente, o Instagram tem 400 milhões de usuários e o Facebook foi ganhando força junto com Instagram na Coreia do Sul.
No Brasil o Facebook possui 105 milhões de usuários, segundo dados deste ano. O Twitter tem 320 milhões de usuários em todo o mundo e 35 milhões no Japão, um de seus maiores mercados.
Coreanos tendem a ver o Twitter como um serviço de nicho, uma plataforma alternativa para as pessoas que procuram exprimir opinião anonimamente. O Twitter não divulga um número de usuário específico do país para a Coreia do Sul, mas a Rankey.com, empresa de pesquisa de mercado, estima que existam 1,2 milhões de usuários do Twitter no país, mas a sua estimativa é baseada em uma pesquisa com 60 mil proprietários de telefones Android e não inclui os usuários do iPhone, de acordo com o Livemint.
Hierarquia
Hierarquia profissional e entre os membros da sociedade é absurdamente respeitada por lá. Professor-aluno, pai-filho, rei-súditos, marido-mulher, velhos-jovens, patrão-empregado. Os mais velhos são muito mais respeitados, se forem chefes ou professores, o nível hierárquico e de respeito aumenta ainda mais. Uma das cenas mais inesperadas que eu presenciei foi quando o nosso anfitrião, que era o diretor da incubadora, levantou-se e avisou que precisava nos deixar, imediatamente os funcionários se levantaram e fizeram aquele sinal cordial abaixando a cabeça. Eu admiro o respeito mas fiquei assustada com o medo, as vezes parecia que eles tinham medo dos superiores.
Uma das profissões mais respeitadas é professor, além de ser uma das poucas que permitem que um cidadão fique rico. Dá para acreditar?
Educação e Empreendedorismo
A cultura competitiva é estimulada desde a infância. O dia começa normalmente às 8h e termina às 16h30 na iniciação escolar, mas espera-se que os alunos estudem antes e depois do horário escolar, seja em casa, na biblioteca ou em escolas privadas onde ficam até tarde (como já comentei é das 8h às 23h). No primeiro momento fiquei chocada, mas depois descobri que na verdade esse horário começa mesmo no período do nosso antigo ginásio, a partir da 5ª série e se estende até o final.
Lembre-se, foi assim, focados na educação que eles conseguiram reerguer o país e estão formando jovens cada vez mais qualificados, o que desencadeia em um novo problema. Muitos jovens qualificados, escassez de mão de obra qualificada e falta de emprego para todos. A saída, que a meu ver foi bem estratégica, é incentivar os jovens a empreender. Trata-se de um país com um dos maiores percentuais da população com ensino superior no mundo apesar da competitividade tão exaltada.
O serviço militar é obrigatório, não existe essa escapadinha que acontece aqui no Brasil. Todos os meninos devem exercer o serviço militar e dura dois anos. Se o rapaz estiver na faculdade ele precisa parar a faculdade, servir e depois voltar para a faculdade.
Eu voltei para o Brasil completamente apaixonada pela Coreia do Sul, pelo povo, pela cultura, pela beleza, pela educação e solidariedade. Ah, e pela quantidade infinita de desenvolvedores! Deu vontade de visitar a Coreia do sul? Dá uma olhadinha nesse vídeo, você vai querer comprar a sua passagem agora mesmo.
* Vanessa Caldas é formada em Marketing com pós-graduação em Gestão de Negócios pelo Ibmec. Empreendeu pela primeira vez aos 19 anos e atua na área de Marketing desde 2003. Participou de processos de reformulação estratégica para pequenas e médias empresas e é apaixonada pelo mundo das startups. Em 2009, criou a AmoMuito.com, e-commerce de moda fast fashion que tornou-se referência no mercado. Desde então, ajuda diversas outras empresas a alavancarem seus negócios, além de desenvolver negócios próprios.
O post Coreia do Sul – O mundo paralelo das startups apareceu primeiro em Startupi.
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